Um acórdão publicado pelo Tribunal de Contas da União (TCU), na última quarta-feira (18), dá à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) um prazo de 90 dias para apresentar um plano de ação para dar fim aos incentivos dados a consumidores que possuem sistema de geração distribuída.
A decisão surgiu de uma representação do Ministério Público (MP). No relatório entregue ao TCU, o MP afirmou que o atual arranjo da Resolução Normativa (REN) 482/2012 da Aneel incorre em tratamento discriminatório entre consumidores que possuem sistema de geração distribuída e os que não possuem tal estrutura de geração de energia. O MP apontou que a agência reguladora estabeleceu diferenciação tarifária entre consumidores sem autorização por lei.
A relatora do acórdão, ministra Ana Arraes, acatou o pedido do Ministério Público e determinou que a Aneel apresente um plano de ação contendo as medidas a serem tomadas, nomes dos responsáveis pelas ações e prazos para a implementação das mudanças com o objetivo de “retirar a diferenciação tarifária percebida entre consumidores de energia elétrica.
Segundo o relatório do MP, a energia injetada no sistema pelo cliente gerador é “comprada” pela concessionária pelo valor convencional, superior ao da tarifa fora de ponta e no período de ponta, o valor pago pelo usuário seria o convencional, inferior à tarifa de ponta.
Desequilíbrio –“Em outras palavras, o microgerador venderia à concessionária energia mais cara e compraria mais barata, o que pode acarretar um desequilíbrio nas contas da distribuidora e, na revisão tarifária, gerar um possível aumento da tarifa”, argumenta o MP.
“A política de subsídio cruzado entre consumidores de energia elétrica, de natureza regressiva em termos de distribuição de renda, tem pressionado a tarifa dos consumidores de menor poder aquisitivo e tornado menos onerosos os gastos dos consumidores com maior renda. No ano de 2018, o gasto com o subsídio foi de cerca de R$ 205 milhões; em 2019, de cerca de R$ 315 milhões; e há expectativa da Aneel de que chegue a cerca de R$ 55 bilhões no período compreendido entre os anos de 2020 a 2035”, concluiu a relatora do acórdão.
Para o sócio da Enecel Energia, empresa especializada em consultoria de suprimento de energia, Raimundo Neto, é preciso que haja incentivo para o microgerador. “Isso ajuda quem está investindo na geração de energia e ajuda também o consumidor que não gera energia. O consumidor vai ter energia mais confiável, melhor distribuída e localizada”, pontua.
O especialista também chama atenção para os benefícios que as concessionárias têm com a geração distribuída. “Você reduz metas e custos com investimentos em infra-estrutura”, acrescenta Neto.
No próprio acórdão publicado pelo TCU, a relatora cita as contribuições da REN 482/2012. “O atual sistema de compensação de energia elétrica (SCEE) contribuiu significativamente para a expansão da mini e da microgeração distribuídas verificada nos últimos oito anos no Brasil, fazendo com que a potência instalada aumentasse em mais de 3.600 vezes e a quantidade desses sistemas crescesse mais de 18 mil vezes”, ressalta.
De acordo com a Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar), até o mês de janeiro de 2020, o Brasil atingiu a marca de 2 GW em geração distribuída de potência instalada. A energia solar fotovoltaica representa 99,8% das instalações no País, totalizando mais de 171 mil sistemas fotovoltaicos conectados à rede, com mais de R$ 10 bilhões investidos desde 2012, nas cinco regiões do território nacional.
Para o diretor da CMU, empresa comercializadora de energia, Walter Fróes, a sustentabilidade da REN 482/2012 deve ser analisada, mas de forma mais ampla e menos passional. “É preciso levar em consideração fatores que não foram citados no relatório do MP, como os benefícios ambientais e a geração de emprego promovida pelo incentivo à geração distribuída”, alerta.
A reportagem tentou contato com a Aneel, mas não obteve retorno até o fechamento da edição.
CHUVA FRACA PODE ELEVAR PREÇOS, DIZ SAFIRA
São Paulo – O início do período úmido com chuvas relativamente fracas e uma retomada mais acelerada do consumo no País estão sustentando os preços da eletricidade, mas o cenário ainda tem incertezas, apontou na sexta-feira (20) a Safira Energia, empresa que atua em serviços, varejo, atacado, entre outros segmentos do setor.
Esses fatores e contratos já celebrados que estão sendo mais pressionados pelo Índice Geral de Preços Mercado (IGP-M) – indicador que enfrenta uma escalada devido à pandemia da Covid-19 – ajudam a impulsionar as cotações, acrescentou a Safira.
Com a retomada da economia observada nos últimos meses, os preços do MWh sofrem variações de R$ 20 a R$ 30 de um dia para outro, relatou a Safira. Contudo, a incerteza de como as chuvas evoluirão ao longo dos próximos meses é um fator importante.
“Não está chovendo como o esperado para o atual período úmido, e vemos os reservatórios com os níveis mais baixos da história. A consequência disso são preços de mercado na ordem de 400 reais/MWh para os últimos meses de 2020”, disse em nota a coordenadora de Gestão de Clientes e Inteligência de Mercado da Safira, Juliana Hornink.
No mercado de curto prazo, o preço subiu 15% para a próxima semana, a cerca de R$ 560, com o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) prevendo um aumento de 1,7% na demanda por eletricidade em novembro e chuvas abaixo da média nos principais reservatórios.
Para 2021, acrescentou a coordenadora da Safira, “os preços também estão pressionados na espera de uma resposta das chuvas”.
Segundo ela, o reaquecimento da economia está levando a um aumento da produção em segmentos industriais, mas também se observa falta de matéria-prima em outros, prejudicando as previsões de crescimento industrial em 2021 em relação a 2020.
Os consumidores livres que terão maior produção certamente precisarão contratar energia excedente no ano que vem.
“Em meio a tantas incertezas de negócios, da economia e mesmo em relação ao preço da energia, sugerimos aguardar até dezembro próximo para verificar como o período úmido e as chuvas irão se configurar”, disse, ponderando que esta orientação aplica-se aos consumidores que já estão contratados e estão em busca de uma oferta de energia para atender seus excedentes de produção.
A questão que se coloca, acrescentou ela, “é o quanto esse cenário pode impactar o consumidor (de energia) na decisão de produzir ou não o seu produto em maior escala, já que a energia vai influenciar na valoração do produto final”. (Reuters)
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