O aumento do consumo de energia devido às altas temperaturas associado à interrupção na transferência de energia das regiões Norte e Nordeste para abastecer o sistema do Sudeste deixou ontem no escuro 10 estados e o Distrito Federal, por volta das 15h.
METRÔ A Linha Amarela do metrô paulistano, utilizada por 700 mil pessoas, parou, provocando correria e protesto. Passageiros precisaram de atendimento médico e duas estações foram fechadas. O estado teve o maior corte individual da carga: foram 850 mil unidades consumidoras, o que representa 10% da demanda total.
O apagão orquestrado ocorre em um momento de baixo nível dos reservatórios das principais usinas hidrelétricas. As chuvas escassas e o forte calor contribuíram para a estratégia, que serviu como uma defesa do sistema, evitando um blecaute generalizado. O ONS explicou que o aumento na demanda por energia desequilibrou as condições de operação. Visando restabelecer a frequência elétrica às suas condições normais, o ONS adotou medidas operativas em conjunto com os agentes distribuidores, disse a instituição em nota, divulgada quatro horas depois do episódio.
Além de Minas e de São Paulo, sofreram corte de energia moradores do Distrito Federal, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Paraná, Santa Catarina, Espírito Santo, Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. O Sudeste cujo nível dos reservatórios caiu para 18,5% na semana passada vive uma situação delicada, dependendo da importação de energia do Nordeste e do Sul para atender à demanda. Menos de 5% da carga total do sistema elétrico brasileiro, segundo o órgão federal, foram impactados. O corte no fornecimento da Cemig foi de 500 MW, enquanto a Eletropaulo sofreu mais, com redução de 1,5 mil MW. No Rio de Janeiro, a Ampla teve que reduzir a oferta em 100 MW.
Sem garantia Apesar da pane, a nota do ONS ressalta haver folga de geração no sistema interligado. O presidente da Associação Brasileira das Grandes Empresas Geradoras de Energia Elétrica, Flávio Neiva, explica que a medida da ONS de orientar as distribuidoras a reduzir o fornecimento foi a maneira encontrada para evitar um apagão generalizado causado por efeito cascata. Assim, a solução foi selecionar as cargas a serem desligadas de forma a causar o menor impacto. Ele afirma que o ONS precisará recalcular o modelo distribuição, transferindo menos energia entre regiões durante os horários de pico para evitar que o sistema volte a ficar vulnerável. Mas adverte: Ninguém garante que não possa ocorrer novamente ainda esse mês.
O diretor-geral da empresa CMU Comercializadora de Energia, Walter Fróes, afirma ter havido uma mudança no perfil do consumidor com o aumento recente da renda do trabalho no Brasil. Com isso, o vilão do consumo energético deixou de ser o chuveiro elétrico e passou a ser o ar-condicionado, o que explica o pico energético no meio da tarde e não mais à noite como anos atrás. (Colaborou Bárbara Nascimento)
Temperatura e consumo nas alturas
O apagão está diretamente ligado à baixa dos reservatórios das maiores regiões consumidoras. No conjunto do Sudeste e Centro-Oeste, regiões consideradas caixas dágua do país, o volume das represas está em apenas 18,27% do total. No Nordeste, segunda maior em capacidade, o nível está em 17,57%. Isso obriga o ONS a distribuir a energia gerada em outras regiões para alimentar a rede ao longo do ano. Segundo o último relatório operacional do ONS, que abrange de 10 a 16 deste mês, o consumo verificado em três das quatro regiões foi superior ao previsto inicialmente.
Na capital mineira, os termômetros marcaram 32,5°C.Em São Paulo, foi registrada a tarde mais quente do ano, com 36,5°C. Em pleno período chuvoso, a última chuva foi em 22 de dezembro. A média pluviométrica da série histórica é de 296 milímetros em janeiro. Segundo o meteorologista Claudemir de Azevedo, até amanhã não há qualquer previsão de chuva.
No corte decretado ontem pelo ONS, São Paulo foi o estado mais afetado, com corte em 24 municípios, segundo a Eletropaulo. As estações República e Luz da Linha 4-Amarela do metrô foram fechadas porque houve um problema de alimentação de energia elétrica na região da Estação da Luz. No Rio, 13 cidades abastecidas pela Ampla ficaram às escuras. O blecaute afetou 580 mil consumidores.
No Distrito Federal, o apagão atingiu 16% das unidades consumidoras 157 mil das 981 mil existentes. Milhares de pessoas ficaram sem energia no meio da tarde em oito localidades. O corte, justificou a Companhia Energética de Brasília (CEB) por meio de nota, obedeceu às ordens do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS). O partido Democratas anunciou que pedirá a convocação do ministro de Minas e Energia, Eduardo Braga (PMDB-AM), para prestar esclarecimentos em comissões da Câmara e do Senado sobre a falta de luz.
DEMANDA Na região Sudeste/Centro-Oeste, a demanda máxima esperada de consumo era de 46 mil MW, mas o verificado foi de 47.8 mil Mw (3,9% acima). Houve, também, consumo acima do esperado no Sul e no Nordeste, de 10,3% e 0,7%, respectivamente. Para piorar, o pico de demanda energética dessa semana nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste é esperado para quinta-feira, quando a demanda deve atingir 61,8 MW entre 20h e 21h.
O corte de energia não surpreende o físico e professor da Universidade de São Paulo (USP), José Goldemberg, uma vez que, segundo ele, o sistema está funcionando no limite. “Estamos assistindo a uma crônica da morte anunciada. Desde 2012, alertamos sobre a crise, disse.
Em lugar de serem acionadas apenas em situações de emergência, as usinas térmicas se tornaram essenciais para a geração de energia no Brasil. “As decisões equivocadas do governo trarão impactos sociais graves”, acrescentou Goldemberg. A opinião é partilhada pelo presidente do Centro Brasileiro de Infraestrutura, Adriano Pires. “O governo preferiu abrir mão de diversificar oferta”, afirmou. (PRF, CP e DA)
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